28 outubro 2008

Zero

Eu não tenho bons pressentimentos, e isso é tudo tudo que eu posso dizer depois do processo eleitoral de São Luis, e o seu desfecho em um segundo turno previsível.
Eu também não tenho mais o que pensar, quando realmente não temos opções verdadeiramente antagônicas, seria realmente melhor se entregar ao carrasco conhecido? Mas será que realmente conhecemos o carrasco?
Considerações a serem feitas, uma coisa que me surpreendeu foi o número de pessoas que não foram votar neste segundo turno, quase alcançando a marca de 200 mil pessoas. Isso sem contar votos brancos e nulos... O TRE não conta votos brancos e nulos... Mas não são votos? Por que então colocar uma tecla na urna que no fim de tudo não irá servir para nada? Eu entendo que o que leva uma pessoa a votar em branco seria a falta de uma opção concreta, e neste caso ela estaria expressando sua opinião. Mas a opinião de quem vota em branco não conta ... Democracia.
Mas ver as pessoas na rua festejando por terem eleito um ex-governador do período da Ditadura Militar pra mim foi surreal. Não que eu fosse partidária do outro candidato, pois quem bem pesquisa sabe que na eleição para Governador eles estavam lá juntinhos, mesma ideologia travestida de nomenclaturas diferentes, farinha do mesmo saco. Contudo o que me doeu foi ver o povo tão desiludido - Ladrão por ladrão, voto no ladrão velhinho, pois já sei que ele vai roubar - Quem não tem mais ilusões e sonhos, pra mim já morreu.
Estava vendo um documentário que se passava no México, e no fim de tudo tirei conclusões propias de que nosso pais é sem duvida dotado da população mais apática e conformada da América Latina.
E não estou me achando superior não, isso também é uma critica a minha pessoa.



26 outubro 2008

A morte anunciada

Quando minha mãe falou que Bisa Bernadina tinha morrido eu confesso que não soube no momento articular as ideias na cabeça. Sentimentos fatalistas sempre tomam conta de mim nessas horas.
Sim, ela era minha Bisavó e tinha até então 99 anos. Eu sabia dentro de mim, e no fundo toda família sabia, que em algum momento ela iria morrer, pois isso era o natural, o inevitável. Mas será que realmente sabemos esperar a morte?
Minha mãe e eu não choravamos, e na verdade eu sempre tento me conter, e pensei que a Bisa merecia descansar. Ficamos ocupadas em ligar para todos, avisar os familiares, tomar cuidado para a pressão arterial da vovó não subir quando recebesse a noticia... E no meio disso tudo eu sempre via a Bisa sorrindo, e seus cabelos todos brancos arrumados em forma de coque preso por um pente... Será que estamos realmente preparados para a morte?

Lembro dela sentada na porta - Lembro de todos, só não me peça pra gravar os nomes.Mas sei quem tu és, a filha da Dezimar - Ela dizia, e levantava seu braço a ralhar pros meninos fazendo poeira. Ela a contar as coisas do seu tempo, tempo longínquo quando era inconcebível se viver amasiado, sem a bênção do padre, onde moça não dizia que estava nos dias das regras e tão pouco pagava em mão de rapaz.
Suas histórias de um realismo fantástico,de mãe d'água e homem que vira bicho, de tesouro do império enterrados debaixo dos cajueiros, dos negros fujões, moças cegas que guardavam mapas de fortunas. A mais assustadora era a do cavaleiro fantasma, guardião de um baú de ouro, sendo que quem o seguisse poderia saber o paradeiro da fortuna perdida. Ela dizia que toda meia-noite ele passava pelo povoado, e o seu cavalo relinchava próximo a janela dos quartos. Eramos crianças e ficavamos assombrados quando o relógio badalava as doze.
Mas do meio pro fim ela se fez tão criança quanto nós, e pedia doces escondida, acolhia certas traquinagens, reclamava quando os "adultos" diziam que ela não podia fazer isso, comer aquilo, dizer acolá... Do meio pro fim perdeu também o pudor de dizer certas coisas, a velhice lhe deu o direito de ofender as vezes, de tirar suas propias conclusões.

Prepara uma pequena bagagem para a viajem, a sentinela ia ser longa. como será que a Bisa se sentiu, ao ver ao longo da sua vida seus filhos, netos e bisnetos morrendo e ela ficando? A morte realmente não quer se fazer entender. E nesse momento me corta a memoria, ela iluminada pelo sol que vinha da porta da cozinha da casa de minha avó, seus cabelos alvos e a claridade em volta da sua silhueta lhe emprestavam um ar profético - Quando chegar a minha hora de morrer, a Virgem Maria vira me dizer em sonho qual será o dia - ela disse serena, cheia de uma certeza carregada apenas pelos que já viveram muitos anos.
Se a Virgem veio lhe avisar eu não sei ao certo, mas talvez tenha lhe preparado o coração, pois diferentemente de nós ela espera a morte como uma visita de longe, que chega e senta, mas não se demora.

03 outubro 2008

Acasos (parteII)

O começo da historia está aqui


- Eita, que bom que meu dinheiro caiu. Finalmente!

- Vamos pro Reagge sábado, disse a amiga. E ela pensou que realmente fazia um bom tempo que não dançava, e gingar aos sons jamaicanos, com o vento do mar nos cabelos, não seria nada mau.

E enquanto ambas caminhavam meio sem rumo, ela mais ainda se deixava levar pela atmosfera permissiva do local - Como eu adoro a Praia Grande, pensou olhando os mirantes e as janelas dos casarões. Olhou também os namorados sentados nos bancos da praça Nauro Machado, e se lembrou da vez que viu aquele que batizou este lugar, sentado nestes mesmos bancos com sua calma, suas historias e sua cabeça branca. Mas agora ela via os namorados se beijando...

- Eu tô com fome! diz a amiga, com uma cara de quem não come a meses - Deu pra perceber, ela responde, e então fazemos o que? Vamos no cachorro quente, ou pra onde - pergunta a amiga.
- Duas opções, churrasco ou pastel!? nada de cachorro quente vai, mas é você quem decide. Hum, então eu decido? Disse a sua amiga, pensando no mesmo instante na tática que usava com seu ex-namorado, pois pra essas coisas corriqueiras não gostava de estar se preocupando, achava melhor delegar aos outros a escolha da sua comida e da sua bebida, contanto que a escolha lhe agradasse de verdade, não via problema.
- Decidi que você decide! disse pra sua amiga em meio a uma gargalhada que chamou a atenção das pessoas sentadas em varias mesas de um bar próximo. Ela gostava daquele bar, principalmente as sextas-feiras quando tinha uma roda de tambor de crioula. As coreiras já se preparavam, os tambores já eram aquecidos, ela estava de saia longa, mas sua amiga escolheu comer pasteis que só são vendidos em um bar no outro extremo da praça, longe do batuque.

Um mesa pra dois - gritaram ambas para o garçom. Agora sim, é só sentar e pedir a cerveja ela pensou, enquanto via o garçom passar o pano sobre a mesa sua amiga conversava com alguém. Vamos sentar aqui- disse a amiga apontando pra mesa onde um rapaz de olhar tímido estava sentado. Mas já pedimos a mesa pro garçom- ela disse, um pouco envergonhada de sentar com desconhecido - Não te preocupa que do mesmo jeito que se pede, se despede - disse a amiga toda serelepe indo ao banheiro - Senta ai com meu amigo, me espera e relaxa menina! pede logo uma cerveja...

E depois de umas (varias) cervejas, pontos em comum no meio de risos rasgados provocados pelo álcool, histórias hilárias, olhares fixos e telefones trocados, ela se sentiu feliz de estar ali naquele lugar. E por um instante pensou que podia ter se arrumado melhor, ter ao menos feito as unhas ou colocado uma roupa menos surrada, mas o ambiente de cumplicidade daquela mesa logo a fez esquecer destas futilidades.
Estava ali com alguém que gostava e conhecendo outro alguém tão interessante quanto. Agradeceu pela vontade louca da amiga em comer pastel, e pensou que são os acasos da vida, que levam e trazem pessoas de nós, que fazem esse mundo não ser uma rotina tão cruel como aquela músic
a de Chico... Aquela em que ela faz tudo sempre igual... Se os telefones trocados servirão para alguma coisa? Ela não sabe, e isso no fundo não importa, pois por mais que tudo mude as sextas-feiras continuarão sextas-feiras...

PS: Eu disse que não era pra criar expectativa...